quinta-feira, 28 de junho de 2018

Freud e as possíveis saídas frente a Transferência Erótica


Uma situação que Freud notou ser comum, digna de nota e que perdura até hoje, é a paciente se apaixonar, declaradamente ou não, pelo seu analista [até então, apenas homem e médico]. Diante dessa situação, leigos daquela época, diriam que existem duas saídas possíveis: que se forme devidamente um casal, e analista e paciente encontrem formas legais de se unir e permanecer juntos; e a segunda e mais provável, o tratamento é interrompido e o trabalho é abandonado.
O próprio autor traz um terceiro caminho que até seria compatível com o tratamento mas se vê impossível por causa da moralidade e dos padrões profissionais: paciente e analista iniciariam um relacionamento amoroso proibido e que não duraria para sempre. Mas como Freud disse, é uma alternativa impossível e que é claro que um psicanalista tem de encarar as coisas de um ponto de vista diferente.  
Ao se tomar o segundo desfecho como referência, após a separação entre paciente e analista, é bem provável que o estado da paciente obrigue-a a procurar outro analista e partir daí se enamore por ele também, e assim por diante, indefinidamente. Esse acontecimento é um dos fundamentos da Psicanálise e pode ser avaliado tanto pelos olhos da paciente como do analista.
Do ponto de vista do analista, Freud diz se tratar de um esclarecimento valioso e útil ao tratamento, e adverte:
“Ele deve reconhecer que o enamoramento da paciente é induzido pela situação analítica e não deve ser atribuído aos encantos de sua própria pessoa; de maneira que não tem nenhum motivo para orgulhar-se de tal ‘conquista’, como seria chamada fora da análise. E é sempre bom lembrar-se disto.” (Freud, 1914/1996)
Já do ponto de vista da paciente, ela sempre terá a alternativa de abandonar o tratamento ou de aceitar que se apaixonara pelo seu médico como algo que não se pode lutar contra.
Freud ressalta que, apesar das inúmeras possíveis interferências de terceiros nessa situação, o bem estar da paciente sempre será a pedra angular do tratamento. Uma vez que esse amor, se analisado, serviria para o restabelecimento da paciente, até então, enamorada e ainda necessitada de seu médico. A espontaneidade da situação tem muito a oferecer ao tratamento se manejada da melhor forma possível. O manejo correto dessa situação, em sua singularidade, é, sem sombra de dúvida, o que deve ficar como instrução e técnica no método analítico até aqui e a partir daqui.




quarta-feira, 20 de junho de 2018

Nos bastidores de Observaçoes sobre o amor de transferencial

Com o início da leitura do texto Observações sobre o amor transferencial (1914), que se encontra no volume 12 da Edição Standard, publicado pela Imago no Brasil, saltam aos olhos dois pontos interessantes que falam e reverberam o contexto histórico, a mentalidade e o muro moral da época. Nesse texto a Psicanálise ainda é exercida apenas por médicos, o que só mudou quando em 1925, surgiu um processo judicial contra Theodor Reik por este exercer a Psicanálise de forma ilegal, posto que não era médico, e a partir daí Freud o defender através do texto “A questão da análise leiga” (1925). O segundo ponto é que só homens atendiam nessa época uma vez que era tão inabitual uma mulher médica. Começou-se então uma discussão na época que mulheres não-médicas poderiam ser analistas porque elas trabalhariam apenas psicanálise com crianças e essa prática estava muito mais ligada a pedagogia, com a educação, do que com uma terapia. Eram maneiras distintas de pensar Psicanálise para os homens e para as mulheres. É importante lembrar que a Psicanálise tinha apenas quinze aninhos quando esse texto que estamos trabalhando foi escrito. Nem precisamos falar o quanto isso mudou com o passar dos anos.

quarta-feira, 6 de junho de 2018

Aviso aos navegantes V... Inversão ou Introversão?

    Continuando nossa série “Aviso aos navegantes”, dessa vez sobre o texto A dinâmica da transferência (Freud, 1912/1996). Na Edição Standard Brasileira, a primeira nota de rodapé no fim da página 114 [nota 1], contém o seguinte texto: “Esses problemas [o uso de termos ambíguos] incluem o traçado de uma linha de distinção entre inversão e regressão” (Freud, 1912/1996, p. 114). O termo inversão saltou aos nossos olhos durante a leitura uma vez que não tinha sido mencionado o texto até então e que poderia ter havido um engano com o termo introversão, de Jung, que havia sido há pouco citado.
    Pois bem, ao ir em busca da versão inglesa de James Strachey, na segunda nota de rodapé da página 102 [nota 2], encontramos a seguinte frase correspondente: “These problems include the drawing of a line of distinction between introversion and regression, (...)” (Freud, 1912/1986, p. 102). Na versão alemã Gesammelte Werke, na terceira nota de rodapé que se inicia na página 367, mas finaliza na página seguinte [nota3], consta o seguinte texto “Die Abgrenzung der Introversion und der Regression gegeneinander” (Freud, 1912/1999, pp. 368).
    Esclarecendo assim que há um erro na tradução brasileira da Edição Standard, da Imago. Onde está o termo inversão é, na verdade o termo introversão. Outras versões utilizadas por nós para a leitura do texto, como a da Cia das Letras, as Obras Incompletas, a versão da Editora Delta, e as versões espanholas (Amorrortu e Ballesteros), não contêm este erro.

Mais uma correção curiosa e cuidadosa para o nosso trabalho! Por hoje é só, abraço a todos!