Continuando nossos estudos sobre o texto O
Inconsciente (1915), a sessão IV é nomeada como "Topografia e dinâmica da repressão"
na edição Standard de 1969; "Tópica e dinâmica do recalque" na edição
de Luiz Hanns. No alemão Freud usou o termo Topik traduzido por tópica,
que quer dizer lugar, ou seja, o pai da psicanálise está discutindo ao longo
deste texto sobre os lugares - Cs, Pcs e Ics - onde acontece o recalque e como
se dá este "ir e vir" das representações.
Podemos ao longo deste texto eleger alguns pontos principais que são extremamente
importantes para a teoria psicanalítica. Um deles é que Freud traz pela
primeira vez com mais consistência a ideia do recalque acontecendo em três
tempos. O primeiro que ele chama de recalque primevo ou primeiro; o segundo é o
recalque propriamente dito, e o terceiro é aquele em que a representação recalcada
no segundo momento retorna (o retorno do recalcado) – o sintoma, por exemplo; que
é também quando Freud nos fala sobre a repetição.
Dando sequência, outro ponto que podemos eleger como de suma importância
neste texto, é quando Freud, discutindo justamente o recalque e seus momentos
questiona: que mecanismo mantém o recalque propriamente dito e assegura o
estabelecimento e a continuação do recalque primeiro? Como resposta ele traz o
conceito de contra-investimento.
Esse outro
processo só pode ser considerado mediante a suposição de um contra-investimento,
por meio da qual o sistema Pcs.
se protege da pressão que sofre por parte da ideia inconsciente. [...] É isso
que representa o permanente dispêndio [de energia] de um recalque primevo,
garantindo, igualmente, a permanência desse recalque. O contra-investimento é o único mecanismo do recalque primevo; no
caso do recalque propriamente dito (‘pressão posterior’) verifica-se, além
disso, a retirada do investimento do Pcs.
É bem possível que seja precisamente o investimento retirado da ideia o utilizado
para o contra-investimento.
(Freud, 1915, p. 208, grifos do autor)
É interessante notar o uso alemão do termo dem Nachdrängen, literalmente a pressão posterior, para se referir
ao recalque (Verdrängung)
propriamente dito, o secundário. Podemos notar o mesmo verbo (drängen – empurrar, forçar) na raiz das
duas palavras. Entretanto no caso do recalque propriamente dito, secundário, o
verbo é acrescido da preposição nach
que sugere um depois, inseparavelmente ligado ao primeiro.
Assim Freud vem nos mostrar que o contra-investimento é a energia que o
recalque usa para agir e o contra-investimento impede que as representações
Ics. venham à consciência, mas, para que essas representações venham à consciência
é necessário um investimento. Assim, de forma geral, quando uma representação
está no Cs. e é recalcada houve uma retirada de investimento da representação
neste sistema para lavá-la ao Ics.. Lá o contra-investimento age impedindo que
esta representação retorne para o Cs., mas com um investimento sobre a
representação, esta retorna ao Cs.
Desta forma Freud nos diz que "Além do ponto de vista dinâmico e tópico
adotamos o econômico" (Freud, 1915, p.208). Este ponto vista é econômico
porque ele vem trabalhar com a energia libidinal (investimento /
contra-investimento) e é ela que faz com que tais representações tomem os
diversos caminhos entre os sistemas Ics., Pcs. e Cs.
Com isso Freud conclui que, com os pontos de vista dinâmico, tópico e
econômico dos processos psíquicos, podemos nos referir à psicanálise como uma
metapsicologia, pois trabalha com conceitos nunca antes estudados/pesquisados
pela psicologia.