Ainda
no que se refere ao par de opostos sadismo/masoquismo, Freud nos suscita uma
dúvida (que continua em discussão em seu texto posterior sobre O problema econômico do masoquismo, de
1924), sobre o caráter primário (ou secundário?) do sadismo. A questão é se o
masoquismo é derivado do sadismo ou vice-e-versa? Inicialmente, Freud
considerava que o ato de infligir dor não se configura como a principal
intenção da pulsão sádica, pois uma criança sádica não tem a intenção de
infligir dor. Entretanto, “uma vez ocorrida a transformação em masoquismo, a
dor é muito apropriada para proporcionar uma finalidade masoquista passiva”
(Freud, 1915, p. 134). Nesse sentido:
Uma
vez que sentir dor se transforme numa finalidade masoquista, a finalidade
sádica de causar dor também pode surgir, retrogressivamente, pois, enquanto
essas dores estão sendo infligidas a outras pessoas, são fruídas
masoquisticamente pelo sujeito através da identificação dele com o objeto
sofredor. Em ambos os casos, naturalmente, não é a dor em si que é fruída, mas
a excitação sexual concomitante – de modo que isso pode ser feito de uma
maneira especialmente conveniente da posição sádica. A fruição da dor seria,
assim, uma finalidade originalmente masoquista, que só pode tornar-se uma
finalidade pulsional em alguém que era originalmente sádico (Freud, 1915, p.134).
A
partir disso, podemos observar que Freud, nesse momento, inclinou-se a
considerar o sadismo como um processo primário ao masoquismo. Dessa forma, se
considerarmos que o sadismo é primário, automaticamente o masoquismo será a
pulsão sádica que retornou ao próprio eu, ou seja, uma mudança de objeto
pulsional. Todavia, se considerarmos que o masoquismo seja primário ao sadismo,
estaremos diante de uma reversão da pulsão ao seu oposto, isto é, uma alteração
da meta pulsional. Por ora, deixaremos essa questão em aberto, pois a mesma
ultrapassa os objetivos de nossa discussão inicial.