sexta-feira, 21 de agosto de 2015

A Lógica do Inconsciente

O capítulo V do texto O Inconsciente (1915), chamado As características especiais do sistema Inconsciente, Freud vem nos falar sobre algumas características peculiares do sistema Inconsciente e de alguns de seus mecanismos de funcionamento e que “apresentam características que não tornamos a encontrar no sistema imediatamente acima dele.” (Freud, 1915/1974, p.213), ou seja, não as encontraremos no sistema Consciente. 

O pai da psicanálise vem nos colocar que no Ics. existem representantes pulsionais que carecem de descarregar seu investimento, impulsos de desejos.  Esses impulsos coexistem tranquilamente no Ics. sem que um influencie o outro. Dessa forma, quando dois impulsos contrários são investidos simultaneamente, ocorre uma espécie de processo de união, onde nenhum deles se anulam, mas cedem uma parte de si mesmo, nas palavras de Freud eles “se combinam para formar uma finalidade intermediária, um meio termo” (1915/1974, p.213). Isso ocorre porque no Inconsciente não existe contradição. Não existe nem mesmo negação, esta é o substituto do recalque. O Inconsciente funciona, como já dissemos, com representantes, impulsos mais ou menos investidos, assim não podemos pensar no Inconsciente funcionando com perspectivas antagônicas, contraditórias, pois toda a atividade desse sistema ocorre devido às censuras entre Ics./Cs.
Além disso, ainda ocorrem outros processos com as intensidades de investimento, como os dois processos psíquicos primários: deslocamento e condensação. O primeiro faz com que uma representação influencie a outra, transforme a outra através do investimento a ela cedida, e o segundo faz com que todo o investimento de outras representações seja levado à uma representação*. Ainda, quando algo do processo primário ocorre no Pcs. e no Cs., as representações contidas nesses dois sistemas são apercebidas como engraçadas, porque os processos de deslocamento e condensação não fazem “sentido” à nossa consciência, que na verdade nem são percebidos em si mesmos. No sistema Pcs. o que é dominante é o processo secundário, que Freud não aborda muito a fundo neste texto, mas esse processo quer dizer mais sobre o pensamento.

Ainda sobre os processos do Ics. Freud nos diz que eles:
(...) são intemporais; isto é, não são ordenados temporalmente, não se alteram com a passagem do tempo; não têm absolutamente qualquer referência ao tempo. A referência ao tempo vincula-se, mais uma vez, ao trabalho do sistema Cs. (Freud, 1915/1974, p.214, grifos do autor)

Aqui temos de considerar a importância de entendermos essa atemporalidade (a tradução por intemporal é mais um erro de tradução). O inconsciente desconhece a passagem do tempo, o que é muito diferente dizer, por exemplo, que o inconsciente desconhece o tempo, ou que no inconsciente não existe o tempo, porque se assim fosse, não seria possível, por exemplo, os três tempos do recalque como já discutimos em outros momentos.

No que se refere à realidade factual, Freud vem nos dizer que esta não é levada em consideração pelo sistema Ics., e que este é regulado pelo princípio de prazer, ou seja ao cumprimento ou não do prazer/desprazer. Já o consciente sim, este é regulado pelo princípio de realidade, que nos leva a considerar mais o mundo externo.

Por fim, como o próprio Freud, podemos resumir então as características principais do sistema Ics. como quatro:

  1.    a isenção de contradição mútua (não há negação);
  2. o processo primário (condensação e deslocamento como mobilidade dos investimentos);
   3. a atemporalidade (o inconsciente desconhece a passagem do tempo);
  4.      e a substituição da realidade externa pela psíquica (o inconsciente é regido pelo princípio do prazer, e não pelo princípio de realidade).


*No livro A Interpretação dos sonhos (1900) Freud vai explicar mais minunciosamente esses dois processos, o deslocamento e a condensação, além de outros.


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