O capítulo V do texto O Inconsciente (1915), chamado As características especiais do sistema Inconsciente,
Freud vem nos falar sobre algumas características peculiares do sistema
Inconsciente e de alguns de seus mecanismos de funcionamento e que “apresentam
características que não tornamos a encontrar no sistema imediatamente acima
dele.” (Freud, 1915/1974, p.213), ou seja, não as encontraremos no sistema
Consciente.
O pai da psicanálise
vem nos colocar que no Ics. existem representantes pulsionais que carecem de
descarregar seu investimento, impulsos de desejos. Esses impulsos coexistem tranquilamente no Ics.
sem que um influencie o outro. Dessa forma, quando dois impulsos contrários são
investidos simultaneamente, ocorre uma espécie de processo de união, onde
nenhum deles se anulam, mas cedem uma parte de si mesmo, nas palavras de Freud
eles “se combinam para formar uma finalidade intermediária, um meio termo” (1915/1974,
p.213). Isso ocorre porque no Inconsciente não existe contradição. Não existe
nem mesmo negação, esta é o substituto do recalque. O Inconsciente funciona,
como já dissemos, com representantes, impulsos mais ou menos investidos, assim
não podemos pensar no Inconsciente funcionando com perspectivas antagônicas,
contraditórias, pois toda a atividade desse sistema ocorre devido às censuras
entre Ics./Cs.
Além disso, ainda
ocorrem outros processos com as intensidades de investimento, como os dois
processos psíquicos primários: deslocamento e condensação. O primeiro faz com
que uma representação influencie a outra, transforme a outra através do
investimento a ela cedida, e o segundo faz com que todo o investimento de
outras representações seja levado à uma representação*. Ainda, quando algo do
processo primário ocorre no Pcs. e no Cs., as representações contidas nesses
dois sistemas são apercebidas como engraçadas, porque os processos de
deslocamento e condensação não fazem “sentido” à nossa consciência, que na
verdade nem são percebidos em si mesmos. No sistema Pcs. o que é dominante é o
processo secundário, que Freud não aborda muito a fundo neste texto, mas esse
processo quer dizer mais sobre o pensamento.
Ainda sobre os
processos do Ics. Freud nos diz que eles:
(...) são intemporais;
isto é, não são ordenados temporalmente, não se alteram com a passagem do
tempo; não têm absolutamente qualquer referência ao tempo. A referência ao
tempo vincula-se, mais uma vez, ao trabalho do sistema Cs. (Freud,
1915/1974, p.214, grifos do autor)
Aqui temos de
considerar a importância de entendermos essa atemporalidade (a tradução por intemporal é mais um erro de tradução). O inconsciente
desconhece a passagem do tempo, o que é muito diferente dizer, por exemplo, que
o inconsciente desconhece o tempo, ou que no inconsciente não existe o tempo, porque
se assim fosse, não seria possível, por exemplo, os três tempos do recalque
como já discutimos em outros momentos.
No que se refere
à realidade factual, Freud vem nos dizer que esta não é levada em consideração
pelo sistema Ics., e que este é regulado pelo princípio de prazer, ou seja ao
cumprimento ou não do prazer/desprazer. Já o consciente sim, este é regulado pelo
princípio de realidade, que nos leva a considerar mais o mundo externo.
Por fim, como o
próprio Freud, podemos resumir então as características principais do sistema
Ics. como quatro:
1. a
isenção de contradição mútua (não há negação);
2. o
processo primário (condensação e deslocamento como mobilidade dos
investimentos);
3. a atemporalidade (o inconsciente desconhece a passagem do tempo);
4.
e
a substituição da realidade externa pela psíquica (o inconsciente é regido pelo
princípio do prazer, e não pelo princípio de realidade).
*No
livro A Interpretação dos sonhos
(1900) Freud vai explicar mais minunciosamente esses dois processos, o
deslocamento e a condensação, além de outros.